terça-feira, 25 de novembro de 2014




Não quero te agradecer
Por este amor
Pelo contrário, quero culpá-lo
Denunciar-te por invasão
Condená-lo
Te mandar para prisão
Tal qual me encontro

Como ousas
Despertar o que hibernava
Em tranquila serenidade
E trazer de volta
Sonhos
Há muito tempo banidos
Como se atreve
A colocar amarras
Em um coração livre
Não percebes
O tamanho da crueldade
Que é amar-te em silêncio

E como se não fosse o bastante
Ainda vem esse ciúme
Não de ti
Não de mim
Mas do nós inexistente
Essa força que comprime
E dói
Que por instantes
Corrói minha mente
Que me impele
A crimes premeditados
Ditados
No breu dessa dor
Que é ver que outros olhos
Fixam os teus
Os meus
Pois tudo em ti me pertence
E não és meu
E tudo em mim
É tão teu
E tão descartado de ti
Ainda assim me sinto completa
Porque quando estás perto
Colores meu céu
Respiras meu ar
Juntas meus eus

Rosinha Morais





segunda-feira, 24 de novembro de 2014

E na minha terra
Tem belezas assim
E tem gente simples
Com quem queremos estar
E tem uma magia
Que só quem nela pisa
Pode sentir
E guarda uma alegria
Que não dá vontade de sair
E na minha terra
A natureza abre os braços
E acolhe os filhos
Dos homens e animais
E afaga nossos egos
E acaricia nossos sonhos
E quem parte
Leva dela uma metade
Que permanece em saudade
E só volta a estar completa
Quando se une outra vez
Ai é uma festa
Regada por lágrimas e sorrisos
Por momentos
Que se tornarão inesquecíveis
Porque minha terra
Embora queira os filhos
Em seu leito a dormir
Sempre os deixa partir
Seguir as escolhas
Ou imposições da vida
De cada um.

Rosinha Morais


Foto de Aleks Braw


Sussurros


Me agrada
Teu sorriso de menino
Teu rosto marcado
Pelas experiências vividas
Teu olhar
Que captura e hipnotiza o meu
Teus gestos simples
De total desapego
A força contida
Na suavidade da tua voz
O teu caminhar
Seguro e sereno
Que me invade em sussurros
Por medo de despertar meu coração
E te amo em segredo de mim mesma
E te sonho herói do meu reino.


Rosinha Morais


Querência


Essa querência
Que anoitece em mim
Embala meu sono
Estimula os sonhos
De um lirismo sem fim

Desperta a alegria
Fantasiosa alegoria
Da minha utopia
E conduz os meus dias
Em eterna poesia

Ah, essa querência
Que me faz sujeito oculto
Na oração do amor
Que retira minhas vírgulas
E me enche de reticências


Rosinha Morais


quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Fênix

Eu que sempre quis voar
Tive as asas cortadas
Eu que sempre quis cantar
Tive a voz calada
Eu que sempre quis amar
Tive os sonhos apagados
Trilhei caminhos sombrios
Cruzei labirintos hostis
Mergulhei no abismo infinito
E então voei
Entoei um canto
Em meu grito
E amei
Amei sem medo
Sem amarras
Sem segredos

Rosinha Morais


sexta-feira, 14 de novembro de 2014

A segunda esposa


Aproximou-se lentamente, parou próximo ao caixão e olhou o morto. Tinha um olhar inexpressivo, ficou parada ali, observando, nenhum músculo do corpo se manifestava, era como uma estátua de mármore, altiva e bela, a pele alva, sem maquiagem, os cabelos negros caiam em cachos pelos ombros. Usava um chapéu preto e uma roupa de corte sério, porém elegante, mas que não escondia as curvas do corpo. Luvas e botas pretas completava o seu figurino. Entre os presentes um burburinho, perguntas e olhares que não a abalava. Da mesma forma que entrou, saiu. Deixando atrás de si um rastro de perfume sofisticado. Logo a viúva foi rodeada e indagada sobre a identidade da visitante, mas também ela estava curiosa, nunca vira tal mulher nem ouvira o marido falar sobre conhecer alguém tão fino como ela aparentava ser.  O serviço religioso começou, a viúva pôs-se a chorar, despedindo do marido que tanto amava. Não lhe fora dado a graça de um filho, para perpetuar a presença do marido, logo ela estaria sozinha com a lembrança daquele amor.
Cristina voltou para casa logo após deixar a capela onde Carlos foi velado. Não derramou uma lágrima, não falou com ninguém, entrou e saiu da capela em silêncio. Agora enquanto subia as escadas até seu quarto, pensou no morto e na serenidade do rosto dele. Fez as malas, arrumou as roupas dela em uma grande mala vermelha e as do marido em uma mala preta. Tinha dado folga aos empregados e encontrava-se sozinha naquela casa enorme, sozinha como sempre vivera, exceto pelas horas em que o marido permanecia ali. Olhou em volta e tudo tinha um toque dele, o cheiro de charuto no escritório, onde uma cadeira de espaldar alto ainda aninhava o livro que ele estava lendo, na mesa o copo de wisky guardava um último gole.
Ela lembrou a alegria que sentiu quando saiu do médico, dois dias antes, com o resultado do exame em mãos. Recebeu o marido com um abraço e um beijo apaixonado, tomaram o café da manhã juntos, conversaram trocando juras de amor, como sempre faziam, subiram para o quarto e ele tomou um banho, depois se amaram, aquela era a rotina dos dois, então ele dormiu. Cristina sorria enquanto velava o sono do marido, naquele dia decidiu que não escreveria, quando ele acordasse para almoçar, queria estar junto.
Depois do almoço, o marido foi para o escritório e ali ficou, quando Cristina entrou, ele levantou e colocou o livro sobre a cadeira, foi abraçá-la e soube da novidade.
Durante sua viagem, Cristina escreveu um novo romance, quando seu agente leu o original, não cabia em si de felicidade, ela era excelente escritora, mas todos aqueles meses sem nenhuma notícia dela foi compensado com o mais belo romance que ele já tinha lido. Podia imaginar o sucesso. Talvez, ela quisesse enfim, vir a público e revelar quem era. Mas quanto a isso ele não teve sucesso.
Ela preferia se manter no anonimato.
Cristina estava ainda mais pálida e com o olhar triste e vazio depois da viagem. Marcou uma reunião com o gerente da sua conta e fez uma transferência, em seguida chamou o seu advogado e transferiu todos os seus bens.
Anabel, a viúva de Carlos, não conseguia esquecer o marido, quase um ano depois da sua morte ela ainda sentia a sua presença e sonhava com ele com frequência. Os médicos nunca conseguiram explicar a causa da morte do marido, era um homem saudável, claro que as vezes bebia com os amigos, mas não era frequente e não fumava, porém o médico insistiu que havia traços de nicotina no organismo dele, ainda ousou dizer que o marido dela fumava charutos finos, como se o Carlos ou ela tivessem dinheiro para comprar charutos, ainda mais charutos finos. Devia haver algum engano, durante muito tempo Anabel lutou pela verdade, mas acabara se conformando com a explicação recebida, estava cansada, só queria ficar em paz com a lembrança do marido, assim ela adormeceu. Acordou no meio da madrugada com uma batida na porta, imaginou quem poderia ser àquela hora, vestiu um roupão sobre a camisola e foi abrir a porta, perguntou quem era, mas ninguém respondeu, ia voltando para o quarto quando pensou ter ouvido um choro, apurou a audição, nada. Então ela ouviu novamente, agora mais forte. Correu até a porta e abriu-a, encontrou um cesto em frente a porta e dentro um bebê chorava. Ela olhou em volta e não viu ninguém. O bebê continuava chorando, ela o levou para dentro da casa e o pegou no colo, ninando-o e, apesar da surpresa, cantando uma canção de ninar até que o bebê adormeceu. Mais uma vez ela foi até porta, não havia ninguém ali e o portão permanecia fechado. Sentou-se no sofá com o bebê dormindo em seu colo. Foi então que viu o envelope. Caminhou até o quarto e colocou o bebê em sua cama, sentou-se e abriu o envelope, retirou de dentro dele um bilhete:
“Por favor, cuide do bebê e ame-o como seu bebê, faço-o feliz porque eu não posso fazê-lo. Ele se chama Carlos, como o pai. Não se preocupe, sei que não tem condições para criar um filho, mas já tomei as providências quanto a isso.”
Anabel, olhou para aquele bebê, seria possível aquilo que estava vivendo? O marido era apaixonado por ela, nunca a traiu. Desde que casaram passara todas as noites em casa. Saia cedo para o trabalho e voltava a noite. Sempre.
Na manhã seguinte, a vizinha chegou com o jornal, que trazia em destaque a notícia sobre a morte de Cristina Prado, detentora de uma grande fortuna, que foi encontrada morta em sua mansão, alguns dias depois de retornar de uma longa viagem. Ali estava estampada uma fotografia dela. Era a mulher do velório. 

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Reencontro


Quis ser astro
Quis ter asa
Quis ser sereia
Subi montanhas
Fugi de casa
Me atirei no mar
Quis crescer
Ser gente grande
Me assustei
Quis ser criança
Mais uma vez
Só na loucura
Me reencontrei.

Rosinha Morais


domingo, 9 de novembro de 2014

Devaneios

A realidade não cabe em mim,
Por isso sonho.
Sonho a chama do teu olhar
Queimando minha pele
Sonho teus lábios a sussurrar
Desejos explícitos
Sonho delírios
Que invadem minha mente
Provocando suspiros
Sonho a rouquidão
Que a paixão produz
Sonho escuridão
E sonho Luz.

Rosinha Morais



sábado, 8 de novembro de 2014

Reclusão



Me aflige o teu silêncio
Tua insolúvel quietude
Teu olhar perdido
Observando o futuro
Tua mente enraizada no passado
Me aflige tua dor
Mesclada pela angústia
Que teus poros não conseguem conter
Teu desespero ritmado
Pelo tamborilar dos teus dedos
Me aflige o teu orgulho
Tua solidão autoimposta
Que impede qualquer proximidade
Teu sorriso de desprezo
Ante os sentimentos de alguém.


Rosinha Morais




terça-feira, 4 de novembro de 2014

Guerreira

Ela passa, toda bela,
Com uma bacia cheia de roupas
Equilibrada na cabeça.
Seus passos são firmes
Como firme é seu caráter.
Ela cumprimenta a todos
Os que cruzam seu caminho,
As marcas em seu rosto
É o retrato de uma vida
Da labuta constante.
Ao chegar em casa,
Depois de lavar, quarar e secar
A roupa sobre o lajedo
Embaixo de um sol ardente,
Ela ainda tem disposição
Para coser e cozer
Roupas e sabores,
Entremeados por orações
Onde cada filha e filho é lembrado,
Onde cada amigo é citado,
Onde toda a fé é expressada.
No fim da tarde,
De banho tomado,
Perfumada e maquiada,
Senta-se na calçada
Para observar a rua.
Em seus momentos de solidão,
O que será que vai em seu coração,
Quais indagações percorrem seus pensamentos?
Mas, são poucos esses momentos
Logo chega uma comadre
Trazendo um filho,
Ou um amigo com quebranto
Para ela benzer
Com um sorriso sempre estampado
No rosto e na alma
Ela logo pega os galhos
E começa a benzeção
Não aceita dinheiro
Faz tudo de coração.
E antes de dormir
Em seu ritual de amor
Faz uma última oração
Pedindo pelos seus entes queridos
Beija a foto de cada filha e do filho
Que no mundo se espalhou.
Chora sua saudade
E adormece esquecendo toda a dor.

Rosinha Morais